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quinta-feira, 22 de março de 2012
Declaração de Amor
Declaração de Amor
de Luís Fernando Veríssimo
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Tentei dizer quanto te amava, aquela vez, baixinho
mas havia um grande berreiro, um enorme burburinho
e, pensando bem, o berçário não era o melhor lugar.
Você de fraldas, uma graça, e eu pelado lado a lado,
cada um recém-chegado
você sem saber ouvir,
eu sem saber falar.
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Tentei de novo, lembro bem, na escola.
Um PS no bilhete pedindo cola
interceptado pela professora como um gavião.
Fui parar na sala da diretora e depois na rua
enquanto você, compreensivelmente, ficou na sua.
A vida é curta, longa é a paixão.
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Numa festinha, ah, nossas festinhas, disse tudo:
“Eu te adoro, te venero, na tua frente fico mudo”
E você não disse nada. E você não disse nada.
Só mais tarde, de ressaca, atinei.
Cheio de amor e cuba, me enganei
e disse tudo para uma almofada.
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Gravei, em vinte árvores, quarenta corações.
O teu nome, o meu, flechas e palpitações:
No mal-me-quer, bem-me-quer, dizimei jardins.
Resultado: sou persona pouco grata
corrido a gritos de “Mata! Mata!”
por conservacionistas, ecólogos e afins.
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Recorri, em desespero, ao gesto obsoleto:
“Se não me segurarem faço um soneto”
E não é que fiz, e até com boas rimas?
Você não leu, e nem sequer ficou sabendo.
Continuo inédito e por teu amor sofrendo
Mas fui premiado num concurso em Minas.
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Comecei a escrever com pincel e piche
num muro branco, o asseio que se lixe,
todo o meu amor para a tua ciência.
Fui preso, aos socos, e fichado.
Dias e mais dias interrogado:
era PC, PC do B ou alguma dissidência?
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Te escrevi com lágrimas , sangue, suor e mel
(você devia ver o estado do papel)
uma carta longa, linda e passional.
De resposta nem uma cartinha,
nem um cartão, nem uma linha!
Vá se confiar no Correio Nacional.
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Com uma serenata, sim, uma serenata
como nos tempos da Cabocla Ingrata
me declararia, respeitando a métrica.
Ardor, tenor, a calçada enluarada…
havia tudo sob a tua sacada
menos tomada pra guitarra elétrica.
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Decidi, então, botar a maior banca
no céu escrever com fumaça branca:
“Te amo, assinado..” e meu nome bem legível.
Já tinha avião, coragem, brevê
tudo para impressionar você
mas veio a crise, faltou o combustível.
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Ontem você me emprestou seu ouvido
e na discoteca, em meio do alarido,
despejei meu coração.
Falei da devoção há anos entalada
e você disse “Eu não escuto nada”.
Curta é a vida, longa é a paixão.
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Na velhice, num asilo, lado a lado
em meio a um silêncio abençoado
direi o que sinto, meu bem.
O meu único medo é que então
empinando a orelha com a mão
você me responda só: “Hein?”
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